terça-feira, 21 de outubro de 2014

Anúncios

Autor: Lucas Alves

Talvez uma característica física, um jeito peculiar de movimentar os braços, uma forma de gesticular com as mãos. Muita coisa pode servir para chamar atenção. Nem sempre dá para conhecer essas pessoas, saber o nome ou a rua onde moram, no entanto elas permanecem na memória, e estas memórias tão vivas são aqui expostas em anúncios, neste exercício híbrido de desenho e texto.
Reconhecer no outro o que também faz parte do “eu” é de igual maneira umas das ações que se faz nesse exercício de revisitação da memória, na busca por um entendimento do “eu” que parte de uma relação com as diferentes pessoas.
O anúncio aqui se apresenta como um registro de impressões provocadas por essa visualização do outro que de alguma forma nos persegue em memória. Nesses anúncios, apenas procura-se pessoas, sem definir uma finalidade concreta para elas. O questionamento surge: Estariam perdidas? As especulações então são as principais provocações nessa tentativa de reconhecimento do outro.
Propõe-se então no processo que as pessoas também intervenham criando anúncios partindo desse mesmo pensamento.
Dicas para criação de anúncio:
·       Relembre uma pessoa que tenha chamado sua atenção
·       Desenhe como você a viu
·       Elabore um texto descrevendo as características da pessoa, situando o lugar que estava quando a avistou
·       Una o desenho e o texto
·       Tire xerox e distribua por aí
A primeira intervenção ocorreu em um evento de estudantes na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, no dia 22 de outubro de 2014, no período da tarde. Os artistas Lucas Alves, Geisa Lima e Jéssica Oliveira distribuíram os anúncios - que eram reproduções xerocadas - enquanto as pessoas circulavam pelo espaço da Universidade.

 

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Texto no cabide: Reza


E ela rezou mais naquele dia, embora soubesse que não tinha motivos para isso.
Na mão um terço. No canto do olho uma lágrima.
Parecia bêbada. Estava bêbada. Quem às três da manhã rezaria tanto?
A tramela, a bacia e a flor de plástico vermelha eram testemunhas de tamanha embriaguez.
- Vovó Antônia dormiu ajoelhada.
Disse a neta quando o dia amanheceu.
Os dias sempre amanheciam assim de joelhos cinzentos e rosto marcado pela textura do lençol.
- Por que reza tanto Antônia?
Essa pergunta já cansava os ouvidos.
Ela não respondia, resmungava, passava a mão nos cabelos e ia dar milho as galinhas.
Nunca quis responder. Nunca sequer deu pistas quanto ao que queria alcançar com as rezas. Se insistiam demais no assunto, descansava o cachimbo do lado esquerdo e fingia surdez, dessas que a idade avançada permite, para poupar maiores chateações.

Gustav Klimt - As três idades da mulher, 1905