segunda-feira, 30 de junho de 2014

Texto no Cabide: Mensagens soltas/presas


Não deveria eu te amar menos?
Não deveria doer tanto te amar demais?
É tanto amor que me esqueço da dor.
Doía segundos atrás, mas agora minha cabeça no travesseiro te traz pra perto de mim.
Ouvi um barulho na TV, esqueci de desligá-la.
Talvez não seja uma má idéia te ligar agora. É seu aniversário! Em aniversários não se dorme.
Em aniversários devemos comemorar em todo o dia. Me deixa morar em você no restante dos dias? Prometo falar baixinho quando eu estiver andando por ruas próximas do ouvido. Prometo forçar menos as passadas pelo teu abdômen. Mas prometa que não vai colocar placas de "proibida a entrada" quando eu quiser mergulhar nos teus olhos sem roupa.
Quanta bobagem eu penso, quantas bobas agem enquanto eu penso.  Já desliguei a TV. Não ouço mais nada, exceto o trem. Ele passa à meia noite quando todos dormem, hoje atrasou mais um pouco. Vamos ver o trem? Te abraço enquanto esperamos. Meu corpo é sempre quente, você nem vai querer se agasalhar.
Posso te fazer um convite?  “Convido-lhe a me amar! (Rua do Chafariz, nº 63)”.


Texto no cabide: Bula

BULA


Era como se fosse tudo muito confuso. Como se fosse tudo feito pra não entender. Era verso improvisado que não precisaria de sentido pra acontecer. Eu não precisava entender, só queria sentir. Me deleitava no detalhe que não me dizia nada, ou talvez me dizia tudo. Dizia e dizia, tudo. E ao mesmo tempo que dizia, me fazia desistir e apagar da memória, querendo que eu criasse algo novo, ouvisse de novo e abrisse os olhos de novo e de novo, com dores que eram próprias do olhar puro.

sábado, 14 de junho de 2014

Texto no cabide: Texto de Geladeira


Obra de Van Gogh

Sabe aquele par de sapatos esquecidos atrás da porta? É pra não esquecer que por ali passei. Acordei cedo, o cheirinho de café despertou minha vontade de encarar o dia que há tanto tempo não vejo, talvez seja um bom dia, ou um mau dia, porém só não quero ser acusado de que não tive atitude suficiente para me entregar a vida.
Mais tarde eu chego em casa.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Texto no cabide: Micropoemas para o Inverno

Obra de Egon Schiele
 Abra aço

Pra que então
Em mim há braços
Se não forem para envolvê-los
em teus abraços?



Saudade

É tanto frio
Que congela a espinhela
Quando entra a saudade
Pela fresta da janela.


segunda-feira, 9 de junho de 2014

Novidade no cabide: Marcador de páginas

Mais marcadores de páginas foram colocados no forno essa semana.
Aqui estão algumas imagens.
cabidedebiongo@gmail.com

 

Até agora músicas e textos tem inspirado cada marcador. Alguns nomes da música brasileira tem embalado o lápis.

Cícero

Léo Fressato

Cassia Eller

Marcelo Jeneci


segunda-feira, 2 de junho de 2014

Texto no Cabide: Para vovô


Pedro, quando eu sentava na mesa de manhã cedo pra te acompanhar no café era simplesmente pra ver tua barba branca, alvinha feito espuma de leite, se sujar com o amarelado da banana cozida. Eu gostava de todo o seu ritual cotidiano de rezar antes de tomar o café e lavar as mãos e barba na bacia verde que ficava ao lado do filtro. Minha mãe já havia dito que não precisava fazer o sinal da cruz no rosto pra se proteger, mas eu olhava disfarçadamente pra você, pra ver sua mão flácida se benzendo e sua boca balbuciando palavras nunca decifradas por mim. Lembro com nitidez da sua imagem, do seu jaleco e do chapéu de couro, de você entrando pra casa quando o sol se punha, ajudado por um cajado de madeira.

Pouca coisa eu entendia e pouco entendo até hoje. Achava engraçado te ver cheirando uma pitada de fumo, com espirros em seqüência. Não sei bem se o fumo lhe fazia mal, mas eu gostava do cheirinho que ele deixava no jaleco marrom. Ele me fazia lembrar das histórias sobre lobisomens que você contava, você descrevia minuciosamente a cena. Recordo sobre as rezas a noite, as senhoras sambadeiras, as casas de farinha e o sinal da cruz livrador.


domingo, 1 de junho de 2014

Texto no cabide: Saber de sofrer

Lucas Alves

Quem sabe de ouvir dizer, não sabe de nada.
Talvez saberia se soubesse sentir e viver.
Saberia se soubesse conhecer...
entender,
ver,
sofrer...
Mas saber de ouvir falar, não garante o saber.
Às vezes até o próprio "ver" engana, a ponto de fazer acreditar simplesmente naquilo que os olhos puderam alcançar.
Ver com os olhos, garante o não saber de nada, ver com coração, que seria um tipo de sentir, te garante um mínimo de saber em saber o que tem por detrás da imensidão que te é permitida quando se aprende a conhecer. Conhecer, não de saber o nome e a rua onde mora, mas sim de sofrer quando abre a porta trancada no íntimo do outro.

Obra: Egon Schiele