terça-feira, 18 de julho de 2017

Texto no Cabide: Lançarei rosas vermelhas

Um mar atravessa minha rua, minhas casas.
De um lado eu vejo os amores impenetráveis, do outro os amores incuráveis.
Nunca me jogo no mar por completo.
Sempre espero a conquista das ondas ou o balanço místico promovido pelo monstro das águas. 
Fecho a porta e espero que montanhas queiram fazer morada no corpo. 
É nessa hora que o rio cai olhos a baixo e eu apenas tento ouvir o som da água.

terça-feira, 23 de maio de 2017

Texto no cabide: Zoé, uma cidade girassol



Quando avistei a cidade de Zoé, fiquei louco. A sensação era de descoberta, entusiasmo e afeto múltiplo por todo o corpo. De longe parecia ser um lugar incrível, o verde tomava todo aquele espaço rodeado de montanhas. Fiquei encantado com a plantação de girassóis na entrada da cidade. Já tinha ouvido falar sobre Zoé em um dos livros de Ítalo Calvino "As cidades invisíveis", mas não tinha conseguido perceber através dos escritos tamanha beleza daquela cidade.
Cheguei de barco, com uma mochila nas costas, um par de sapatos desgastados do tempo, me instalei em uma daquelas pousadas próximas de lindas estátuas de mulheres gordas feitas por uma artista da cidade. Era incrível ter como ponto de referência aquelas belíssimas esculturas a céu aberto. Me encantei por Zoé, estava perdidamente apaixonado pela calmaria que aquelas ruas me traziam pelo simples fato de andar errante, de coração aberto para o que aquela cidade iria me contar. Sim, cidades são pessoas, corpos percorridos por amantes inquietos, que se permitem a experiência de caminhar e ser afetado.
Minhas manhãs eram sempre invocadas. A sensação que eu tinha, quando acordava, era que a cidade permanecia em sentinela nas minhas horas de sono. O sol batia forte na minha janela, e era como um convite de quem feliz estava pela presença do forasteiro. Só naquelas manhãs entendia o porquê dos girassóis tão alegrinhos na entrada da cidade, nos arredores e quintais das casas. Isso mesmo, descobri em poucos dias que Zoé era repleta de girassóis. Decidi em duas semanas que queria morar lá, ter filhos e construir minha vida longe de toda tristeza que o passado já tinha me revelado. Já estava decidido, minha casa teria girassóis no quintal, bolo e café na cozinha. Na sala uma pintura que fiz em uma oficina de aquarela.
A feira de Zoé era repleta de coisas incríveis. Claro que me engracei logo pelo bolo de chocolate no pote, vendido por uma daquelas senhoras que se dedicava intensivamente a gastronomia. As barracas da feira sempre eram coloridas, mas a cor amarela predominava nos extremos. Seria aquela cidade, em seu formato no mapa, um lindo Girassol? Não tenho dúvidas de que pelo menos fortes semelhanças teria com essa flor tão intrigante.
A cidade tinha um cheiro que impregnava em meu corpo e minhas roupas. Era um cheiro que memorava tudo de bom que vivi em Zoé em fão pouco tempo que estava instalado por lá. Lembro que semanas antes de descobrir a cidade que tanto me encantava, sonhei que atravessava um rio de barco, acompanhado por alguém que remava, chegava a uma ilha, com casas simples. Uma mulher com um recipiente nas mãos vinha em minha direção e se apresentava, seu rosto não se revelava, nas mãos tinha uma espada. Aos arredores cavalos brancos se esbanjavam no verde beira-rio. Esses sonhos parecem sempre ser percepções do que sucederá, e de fato foi, ou talvez eu simplesmente tenha interpretado dessa maneira.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Texto no Cabide: Mensagem para um panda























Entramos no mesmo barco juntos, e em meio a tantas tempestades, conseguimos remontar o casco deste barco. Organizamos juntos o movimento do remo, dispersamos tubarões e analisamos de forma ingênua a direção do vento. Você com sua mania de seguir o ritual cotidiano da forma mais metodológica possível, junto a mim, com a vontade insana de deixar as coisas acontecerem sem muito planejamento, construímos um lindo percurso em cima do mar, mais especificamente, na baía de todos os santos.
Foi nesse percurso que aprendi muita coisa sobre a vida. Aprendi que quando alguém mente, pode ser chamado de “potoqueiro”. Compreendi que pandas tem suas subjetividades, que gostam de um tom de verde específico, que se alimentam de coxinha e são ciumentos. Foi nessas conversas navegando sobre o mar, que compreendi que o destino realmente queria nos juntar para vivenciarmos a irmandade.
Somos migrantes, e viemos de terras longínquas, somos o testemunho da saudade, como também da busca de sonhos. Somos amantes das artes, forasteiros errantes numa cidade cheia de legos em montagem, em ruínas. Provamos com exatidão o gosto do bom acolhimento, e de igual modo, da frieza de quem deixou cair no caminho parte de seus sonhos.
Rimos muito de tudo, choramos, nos entediamos, ficamos nervosos e quisemos matar os mesmos leões durante vários dias. Mal sabíamos que duraríamos estes 9 meses juntos, é o período de uma gestação, confirma mais uma vez a irmandade, somos irmãos gêmeos. A partir daqui então haverá o nascimento, o crescimento e o amor pelo desbravamento. Hoje, nesta sexta-feira 13, de um dia lindo, te agradeço mana por existir e compartilhar a vida comigo.